Rumo a Gramado... (quarto dia)

Nada é mais gostoso,

do que recebermos aquilo que não esperamos,

que nos faz bem,

nos faz mais felizes...


Rumo a Gramado... (quarto dia)
(Paulo R. Boblitz - 15/set/2013)

O dia amanhecera bonito, quase sem nuvens... Nosso destino de hoje seria Urubici, enfim as serras de que tanto gosto...

Por Indaial já tínhamos passado no dia anterior, a caminho de Blumenau. Nosso dia hoje seria atravessar a ponte pênsil que liga o bairro de Warnow à BR, passar em Ascurra, depois em Apiúna, Salto Pilão onde tentaríamos o passeio da Maria Fumaça, Lontras, Rio do Sul, Aurora, Ituporanga, Petrolândia, finalmente Urubici, um dia com cerca de 210 quilômetros, quase todo pelo asfalto.

Na marca certa, abandonamos a BR-470 e seguimos pequeno trecho até a ponte pênsil do Warnow. À nossa frente, um desses tratores pequeninos aguardando o sinal tornar-se verde, pois a ponte só comporta 1 veículo de cada vez. Assim, o sinal serve para as duas cabeceiras, quando aberto para um lado, fechado para o outro.

A esposa olhou aquele troço balançando enquanto o automóvel atravessava em nossa direção, virou-se para mim e perguntou:

- Você não vai atravessar isso daí não, né!?

Olhei para ela, olhei para o rio Itajaí-Açu, largo da bexiga, e com certeza fundo que só o cabrunco, olhei para a ponte que ondulava igual camelo, olhei para a esposa novamente, e respondi:

- Vamos...

Nunca na minha vida, havia atravessado, de carro, um trem daqueles... Eu também estava receoso, mas o sinal tornou-se verde e nem deu tempo de discutirmos... Deixei que o tratorzinho criasse alguma distância entre nós, engatei a primeira, destravei as portas, abri os vidros e pedi para a esposa retirar o cinto de segurança, no que ela arregalou os olhos para mim, mas já estávamos estalando e rangendo todas as tábuas grossas debaixo de nós...

Eu já estava ocupado, então faltava ocupar a mulher...:

- Mulher, pega a máquina e vai fotografando... - e foi um santo remédio...

Chegamos do outro lado, sorrindo, mas precisávamos voltar. Fiz a manobra e novamente aguardamos o semáforo abrir para nós, como dois tabaréus felizes... Não sei por que, mas acho que quando chegamos do outro lado, a esposa queria dar mais uma voltinha naquela gangorra doida...

Seguíamos o Itajaí-Açu, que nos próximos dias seria manchete nacional; por enquanto ele corria plácido e comportado à nossa esquerda. Em Ascurra, depois de atravessarmos a ponte, passou a nos brindar à direita, até chegarmos em Salto Pilão, onde tentaríamos o passeio de Maria Fumaça, porém descobrimos que ele ocorre sempre no segundo Domingo de cada mês; estávamos no terceiro Domingo, mas não fazia mal, nossa Maria Fumaça aconteceria em Bento Gonçalves. Por enquanto, bastavam os arcos do velho viaduto, onde ela passa fumegante por cima...

Seguimos em frente e em Rio do Sul, paramos para comprar dois sorvetes; o dia esquentava, mas seu calor estava com as horas contadas, pois em Petrolândia começaríamos a subir...

Em Aurora, pequena cidade simpática e arrumada num meandro do Itajaí-Açu, saímos da rodovia e lhe passamos por dentro, 1.080 metros de extensão, pequenos blocos de concreto como pavimento a nos cantarem a música dos pneus, uma bela igreja cheia de fiéis, o que me fez pensar que não é o tamanho da cidade que produz os belos templos, mas sim o tamanho da devoção de seus habitantes... O querer é o poder, mas antes disso, há que se ter a cultura, o desejo do construir, sociedade e cidadania, respeito e família, terra e pátria...

Em Aurora vimos outra ponte pênsil e até nos sentimos tentados a atravessá-la, mas a hora já nos apresentava a fome..., quando vi uma mulher em disparada, no mínimo a 50 km por hora, atravessando aquela geringonça..., e lembramos do cuidado que tivemos em atravessar bem devagar a nossa própria ponte... O que o dia-a-dia não faz..?

Fome é um negócio que atrapalha, que fica a nos perturbar o tempo inteiro, encher o saco por assim dizer, enquanto não a atendemos... Mas também não é assim, isso de pararmos em qualquer lugar. Determinados, íamos seguindo em frente até encontrarmos algo especial, e encontramos, o Restaurante Freiberger, uma bonita placa que nos lançava fora da rodovia por pelo menos 1.300 metros.

Quando lá estacionamos, um senhor passeava de um lado para o outro, sob a sombra gostosa das tantas árvores. Sorridente achegou-se até a nós quando começávamos a caminhar para o restaurante, e piscando o olho para mim, informou que só a partir da 1 e meia. Olhamos o relógio, eram 12 horas em ponto! Doido era quem ficava ali para esperar... Então ele escancarou ainda mais o sorriso e nos informou que era brincadeira, que já estava próximo do servir...

Nos apertamos as mãos, nos apresentamos e seguimos para o restaurante, onde escolhemos a nossa própria mesa, e ele foi sentar com a esposa. Estavam arrumando a grande mesa com muitas travessas grandes de muitas comidas diferentes, coisa para deixar de água na boca aos que gostam de um prato cheio, nada de pesar no quilo, mas livre para quem aguentasse comer daquilo tudo... Não é à toa que engordei seis quilos nessa viagem...

A mulher olhou para o meu prato, olhou para meus olhos, e me saí com essa:

- A maioria é verdura..!

O fato é que ficamos encantados com tantas variedades daquilo que não somos acostumados a comer, afinal moramos no Nordeste, e o Sul, não tem nada parecido..., ainda mais se carregado no alemão, no italiano, nas tantas imigrações que vieram enriquecer a nossa pátria Brasil...

Saí dali tão embevecido, que até esqueci de ligar o GPS, somente lembrando em Ituporanga, poucos quilômetros à frente.

Petrolândia estava perto, onde o asfalto acabaria, assim eu esperava, mas não sabia que haveria tantas pedras... Assim, pergunto-me se Petrolândia é dedicação a Dom Pedro, Primeiro ou Segundo, ou se é devido às tantas pedras...

Reduzimos para 30 km por hora, às vezes 20, e acabamos tomando o caminho errado... Em Petrolândia, não se fez mal em perguntar, e perguntamos exatamente a um pequeno caminhão, boleia cheia de gente, e na carroceria, uma porção de gente sentada... Muito alegres, muita gente informando ao mesmo tempo, descobrimos que estávamos na direção correta, sempre em frente para Urubici...

Nossos Anjos da Guarda nos protegem, é um fato, e esse pequeno caminhão, acabamos encontrando várias vezes pelo caminho, que não era assim tão em frente... Para subir aquela serra tão empinada, realmente só havia um caminho, mas lá em cima, os tais Cruzamentos em V... Do primeiro nos livramos, mas do segundo, interpretamos errado e fomos parar na represa Perimbó, um amontoado de água que alguma grande empresa, acho que a Klabin, resolveu aprisionar para gerar energia...

Quando vimos o pequeno caminhão, paramos e nos dirigimos até eles...

- Mas vocês não poderiam ter vindo para cá!

- Vocês tinham que seguir em frente!

Ponderei que seguimos a principal, e que por isso, chegamos até ali... Era uma lâmina d'água solene em meio a tantas árvores, onde caniços se preparavam para pescar. O lugar era simplesmente lindo e maravilhoso, mas logo os Borrachudos encontraram as minhas pernas desnudas, e eu já os tinha em péssima conta, ainda mais perdido pelo caminho...

Batemos apenas uma foto e saímos dali, na verdade eu saí, porque os borrachudos haviam me elegido como presa filé, como prenda a ser mordido, cada tapa, sangue na pele branca, coceira que eu sabia, me perseguiria por vários dias. Voltamos tudo novamente, sem praguejar, eu no caso, e pegar o tal do V para o lado certo, nesse caso, o caminho mais feio, prova de que a maioria dos que utilizavam aquele caminho, sempre se dirigiam para o lago.

Enfim a estrada das tantas pedras acabou, e pegamos a BR-282, à esquerda... Urubici não estava longe, mas antes haveríamos de passar pelo belo Santuário Diocesano Nossa Senhora Aparecida, realmente muito bonito e cuidado, onde no sopé, bebemos um gostoso Caldo de Cana, espremido por moenda especial, enorme e cheia de dentes e cilindros, antiga-moderna a nos encantar...

Urubici estava próxima, e novamente nos vimos subindo; uma pequena garoa agora nos perseguia... O frio se fazia e começava a penetrar por entre as várias frestas que o nosso corpo apresenta; estávamos a quase 900 metros sobre o nível do mar, e o tempo há muito que havia mudado...

Chegamos quase anoitecendo na Pousada da Celia, a mesma em que eu havia ficado no ano passado nessa mesma época; estávamos em casa... Dona Celia e Ana Celia, sua filha, conversaram bastante conosco, pessoas simpáticas e acolhedoras, agora com vários compartimentos bem construídos, alvenaria por fora, madeira por dentro para manter o quentinho gostoso, construção cara que nos aconchega ao carinho do ser bem-vindo e bem tratado por quem quer bem receber... Trouxe-nos um ventilador, mas duvidou que o ligássemos. Não o ligamos... A frente fria finalmente nos havia alcançado, e dali em diante, seria muita chuva e muito frio...

Invejei minha esposa que foi preparada para tanto frio. Minhas pernas ainda estão esfarinhando, queimadas pelas baixas temperaturas...

Jantamos e fomos dormir, afinal, o dia seguinte seria muito insano...

* * *

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