Quem nunca observou, não perca a chance...
Tudo nessa vida faz barulho...; tudo tem áudio...
Por que vocês não entram nos próprios filmes?
O meu está logo a seguir, e não é pirata...
Minha vida é um filme
(Paulo Boblitz - jun/2009)
Acordo sempre cedo todos os dias..., às vezes pelo som do despertador, ali para qualquer coisa, e outras vezes pelo som da claridade, que vibra em meus olhos produzindo lampejos de lucidez...
Abro os olhos e rezo, mas confesso que a reza é apressada, afinal a bexiga sempre acorda cheia...
Num instante começamos a ouvir barulhos...; é o colchão que se espreme, a sandália que arrasta onde visto o pé, a coberta posta de lado, o levantar estalando as juntas, o clique do botão do banheiro acendendo a luz, o bocejo expulsando a preguiça, o mijo caindo, um pum em liberdade...
O barulho aumenta com a descarga, a imagem do espelho quase grita, desgrenhada e um pouco inchada... Água que cai numa torneira aberta, o armário que se abre, a pasta na escova...
Pisco e mais um pouco encaro a escovação, som mecânico de limpeza, oco raspando algo...
Um galo ao longe também diz que já está acordado...; logo outros também confirmam...
Lavo o rosto e o som agora é outro... Apago a luz e vou fazer café; uma torneira se abre e encho o copo, água em jejum sempre faz bem; a pequena cadela vem dar bom dia, faz o barulho de um cheiro e vai embora...
Mais água caindo, agora na cafeteira, o filtro de aço é encaixado; abro o armário e pego o café, abro o pequeno pote, uma gaveta e a colher bate na outra..., depois arranha o pó e o despeja...; já posso unir as duas partes, e aço com aço vão se enroscando; a cafeteira está pronta, não sem antes bater no fogão... Acendo um fósforo, que acende o fogo... Agora é só esperar, ouvindo outros sons que não os nossos, um pingo que cai, outro galo que canta, um motor que passa, a cadela que se coça...
Sentado apenas aguardo, e por instantes tento repassar ou simplesmente pensar no novo dia, todo dia a mesma coisa, os mesmos sons, o mesmo aroma que agora me invade fazendo barulho do borbulhar do vapor; é o café saboroso que desperta, mais cheiroso do que gostoso, que queima a língua suavemente, nos transmite o calor esquentando as caldeiras...
Como algo e o mastigar tem seu próprio som, que sacia e satisfaz, produzindo energias... Pego meu café e vou ao computador, mais um som de botão sendo clicado, pequenos motores aumentando as rotações, o monitor nos dando informações, um bipe..!, mas sem ele também seria a mesma coisa...
O brilho se espalha, a esposa se mexe mudando de posição, fica mais um pouco, pois todos temos os nossos horários; o dela começa um pouco depois, com outros barulhos diferentes, uma filha para acordar, livros a juntar, tarefas a lembrar...
Os barulhos, devagar vão aumentando; agora existem vozes... - é a preguiça indo embora, cedendo lugar aos afazeres...
Meu café já acabou, hora do banho e do vestir, cada etapa tem seu barulho...; uma toalha, um pente, um zíper, um cadarço, papéis que são juntados, documentos enchendo o bolso, a porta que se abre, o até logo pronunciado, separando os barulhos que vão, dos barulhos que ficam...
Ligo o motor e aperto o cinto, engato a primeira e acelero, entro no ritmo dos que se movem...; agora são freios, buzinadas, arrancadas, apressados, o barulho mudo de quem oferece o jornal no semáforo, mostrando bem grande as mazelas do dia, gritando no barulho das letras, a fofoca em voga...
Levanto os vidros e escuto meu suspiro, todo dia os mesmos barulhos, não tão iguais mas parecidos, afinal vamos em frente a cada dia, mais um barulho novo conquistamos, nossa cabeça que amadurece, que mais reflete nos barulhos antigos...
No trabalho, o crachá faz emitir um bipe, que aciona a cancela, que oficialmente informa que existimos; estamos ali para produzir...
Novos barulhos, também os mesmos, vão se repetindo até irmos embora; um outro banho, mais um café, mais uma vez o teclado, quem sabe algo a escrever, até o bocejo atrapalhar, informar mais um silêncio que se aproxima...
Uma nova reza que não chega ao fim, pois pegamos no sono e sonhamos...; mais barulhos se nos chegam, nos vêm informar que estamos vivos, por enquanto libertos a navegar, a fazer o que nunca pensamos fazer, coisas da mente que, solta, começa a aprontar..., até que o despertador perca o pudor, ou a claridade perca o véu...
Abro os olhos e tudo começa de novo, os mesmos barulhos, as mesmas coisas, tudo igual...
Não fossem os problemas que se renovam, não fossem as soluções que imaginamos, não fossem os obstáculos que contornamos..., as alegrias que sorrimos, o tempo..., esse não passaria...
Seria como se estivéssemos na tecla pausa...
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