Pelas terras, pelo Iguaçu, do Paraná... (dia 7)

Ao repararmos nossas grandes obras,

sentimos orgulho do nosso passado...

Ao vermos nossas conquistas,

sentimos orgulho de nossos trabalhos...

Água, essa grande empreendedora...
(Paulo R. Boblitz - 13/fev/2015)

Ainda escuro, a chuva pingava fraca... Pensei: "será um dia molhado...", e bem sabíamos o que era um dia molhado, pelas lembranças de Santa Catarina, quando fomos de Gravatal até Guatá, o dia inteiro de chuva grossa, frio e sujeira das tantas lamas que respingaram...

Naquilo que você pode fazer, pelo trabalho você resolve, mas, naquilo que não depende de você, resta apenas o enfrentar. Quando chegasse a hora, enfrentaríamos...

Os desgostos com a Pousada do Madruga ainda não tinham terminado, quando me cobraram o dobro do combinado; pior ainda, foi o argumento da desculpa... Antes quando mais jovem, costumava alterar-me nalguma fala mais ríspida; hoje não discuto mais quando me decepcionam, porém não abro mão de minha expressão de tristeza e desprezo, diante das mesquinharias, afinal dinheiro é papel, depois a gente conquista mais. Por outro lado, talvez seja o preço justo por podermos visualizar o brilho diferente, nos olhos de quem nos está explorando...

Paguei, dei-lhes um bom dia e nos afastamos; o céu estava lindo, cinza d'água carregado, um pinguinho aqui, outro ali, apenas marcando presença.

Frios, iniciamos lentamente o nosso caminho, tão ansiado por duas belas razões: nossa primeira hidrelétrica, depois uma bela montanha a subir quase tudo de uma só vez. Que chovesse então, mas só depois da visita à usina.

Pelo caminho, desviando das poças, ainda vimos a pobre árvore caída, arrancada pelo forte vento da tarde anterior; soubemos que ao todo, ele conseguira derrubar mais duas...

Sofia de repente pareceu ficar encantada, momentos em que a deixo solta, sem pedalar, sem frear, livre para seguir o caminho que achar melhor; Beijinhos... Sofia achegou-se para a margem direita, afundou o guidão aproximando-se o quanto pode das pequeninas flores, conhecidas por Beijinhos, lançando-lhes também, beijos e sorrisos...

Por instantes também observei a natureza das coisas, duas criaturas lindas conversando, Sofia e flores...

Dei-lhe um ligeiro toque no pescoço, que ela sempre entende como ser a hora de começarmos a novamente andar. O terreno cedeu lugar para um asfalto, um pouco abandonado, talvez do tempo em que tudo aquilo fervilhou durante a construção, que a Natureza, implacável, sempre tenta recuperar...

Chegar àquela encruzilhada, foi como se tivéssemos pulado a cerca que dividia a selva, da civilização. Desceríamos tudo só para a nossa visita, quase 100 metros, apenas para conhecermos a obra do homem a gerar riquezas, onde muitas centenas de dinamite, deslocaram milhões de toneladas em rochas, esculpindo em arte, a arte de se produzir energia.

Por instantes, lembrei de Itaipu, dezenas de vezes maior do que aquela que se descortinava à minha frente, recentemente destronada do título de a maior hidrelétrica do mundo; faltava ainda muito chão para eu e Sofia chegarmos em Foz do Iguaçu.

Como se fosse uma pirâmide, onde cada pedra foi colocada pelo artesão, represando um mundo d'água que a todo instante, tenta rebelar-se.

Tudo é gigantesco, tudo é pequenino, pois que de longe olhamos, e imaginei toda aquela fúria em dia de cheia, espumando e descendo com força destruidora, naquele imenso tobogã, onde as comportas seguram com firmeza, todo aquele potencial, deixando que passem em manadas organizadas, seis trens d'água que não se acabam mais, a não ser quando o rio se acalma, o choro das nuvens interrompe, a revolta é contida...

Um trabalho de amor nos chama a atenção, em lugar não muito visível, mesmo assim bem trabalhado, bem continuado, em verde sobre o verde, o símbolo da COPEL ao natural, pelo vegetal, quando mãos gentis o plantaram, o podam até hoje, como a pira que não se apaga. Olhei para ele, enxergando muitos significados: relâmpagos domados, ao centro uma turbina, tal qual ampulheta, que pega o tempo do rio e transforma em energia, ou bem podem ser suas torres de distribuição. Sendo o que for, é forte, produz o progresso...

Acima de tudo aquilo, sempre em posição do maior destaque, a bandeira do meu país, linda a contrastar com o céu, brava resistindo ao tempo, esse mesmo que os homens não respeitam, que os bravos defendem com a própria vida. Tímida em dia de pouco vento, mostra seus fiapos como sementes, que vão, assim mesmo, desgarrando-se e germinando em cada mente que a mire com respeito, com orgulho desse solo que tão gentil abriga, gente de todas as gentes...

Ao longe, pequena cascata irreverente, por correr solta independente...

Olhei o relógio e já eram 9 horas; tínhamos que ir embora, afinal havia uma bela montanha a ser vencida. Em cada mirante, ou janela para o lago, vamos parando, desculpas para renovar respiração, circulação, os ares da mente, tornando o espírito mais valente, deslumbrando-me com tudo aquilo, meu de presente...

Começamos enfim a subida, primeiro um pé, depois o outro, sucessivamente sem parar, até chegarmos numa bela curva, oásis em 180 graus, momento de paz naquilo que estava difícil, mais uma produção cuidada de quem com amor cuida, como se fosse uma praça para nossos olhos, templo para nossas reflexões, pintura do grande mestre para a nossa atenção; vi ali também, as mãos da COPEL...

E quanto mais alto, mais nosso orgulho desmente, qualquer cansaço que se apresente, qualquer dor que se mostre... Ali, quem nos move é a paixão; Biologia e Física que nos perdoem, pois que uma intensa alegria se faz regente, bailando vertentes, rompendo barreiras, sonando suores que voltam à terra, como cristais solventes, nossas marcas ali para sempre, misturando-se ao de sempre, seja lá o que for, até o dia em que descobrirem uma máquina inteligente, decodificadora de genes, que apontará que por ali passei, ou que por ali suei... Estávamos mais altos do que as nuvens, que em bando, fofocavam com o grande lago...

Chegamos num ponto em que o zoom da máquina já não mais aproxima, não torna grande, e mesmo com o zoom aplicado, ainda assim mostra muito longe, muito pequeno, e nosso coração se rejubila, palpita em alegria, mais irradia nossa emoção, porque afinal, tudo aquilo foi nossa conquista, empurrados por algo maior, nossas vontades, por sua vez inspiradas, nAquele a quem amamos...

Faltando cerca de 20 minutos para as onze, descobri uma pousada à minha direita; se tivesse que comer, que fosse ali, afinal aquelas três fatias de pão do café da manhã, há muito que tinham sido diluídas. Parei, desci, e para minha sorte, o almoço já estava a ser servido. Renovei minhas águas, minhas energias, renovei até a minha fé, pois havia pedalado apenas 15 quilômetros, de um total que seriam pouco mais de 50.

Verifiquei minha altimetria, vi que a parte mais empinada já havia sido deixada para trás, faltando pouco para o topo. Enquanto comia, a chuva despejava seu caldo sem parcimônia, e até parece que marcamos encontro na minha partida, ela ficando e eu saindo...

Uma e meia da tarde, avistava a placa de que pinhão estava apenas a 10 quilômetros dali; Duas e dez, aportávamos em porto seguro... Agora seria lavar o que pudesse lavar, conversar com os de casa, arrumar Sofia para o outro dia, já que ela sempre dorme cedo, pois não abdica do direito de me cutucar também bem cedo no dia seguinte, um dia que prometia emoções, somente eu sabia, por ter mapeado a andação. Como na noite anterior, isso também veríamos na hora em que acontecesse.

Por ora, era bom anotar: tinham sido 50,34 quilômetros pedalados, 6 horas e 20 minutos pedalando, 3.744 calorias perdidas, frequência média cardíaca de 123 bpm, numa frequência máxima de 145 batimentos por minuto, e 885 metros, subindo acumulados, um bom dia de trabalho, um bom dia de descanso, pois que com os suores, vão-se todos os males... 

Agora era hora de procurarmos comida, depois, um bom sorvete...

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