O leite azeda,
e dele saem os bons queijos...
Os cereais fermentam,
e deles saem as boas cervejas...
Nossas vidas azedam,
daí nascem as boas lições...
O que era doce, bem..., quase que azedava...
(Paulo R. Boblitz - 12/fev/2015)
Em todo o planejamento do roteiro, era o dia mais esperado; piso de chão, paisagens belíssimas, um lago encantador, uma balsa a nos esfriar o sangue na travessia...
Não estamos competindo;
Não estamos com raiva da vida;
Não estamos com raiva do equipamento;
Nem tampouco estamos com o cabrunco...
O vinho lhe devolve ao chão, lhe abre a razão, até alimenta o corpo que, ávido e desnutrido pela força, requer tudo que lhe caia, para a fornalha das energias...
E lembrei sorrindo, que conheço gente boba que paga caro por gramas retirados de suas bicis. Creio que não devem ter uma consciência plena daquilo que é pedalar; creio que devem ser indecisos entre o ser ou o estar, porque Sofia, e a carga que ela carrega, por pesada que seja, minhas pernas sempre darão conta; no dia que não derem, eu e Sofia nos aposentaremos...
Vinho garantido, agora precisava garantir chegar lá, e foi difícil, podem acreditar, porque as subidas não ajudavam com suas pedras soltas, não ajudavam com seus ângulos de incremento, afinal, caminhos por entre os matos, servem apenas para o ligar, porque as facilidades, só as encontramos nas rodovias. Faltando 10 minutos para as onze, cheguei naquilo que se parecia com um lugar onde se poderia comer alguma coisa; a fome há muito que apertava, por conta do café fraco, falso alicerce daquele dia...
Sofia é brincalhona e não perde as oportunidades; a cada pedra que saía chispando disparada pelos pneus, Sofia gritava irrááá... No começo, até achei engraçado, mas depois de muitos irrááás, parei numa sombra e tive uma conversa com ela:
- Sofia, você está tirando a minha concentração...
Recomeçamos, e como ela havia prometido, não fez mais nenhum barulho, mas nem por isso deixou de procurar as pedras, que adotavam os mais inusitados sons em disparada... Eu apenas ria por dentro... Empurrei Sofia, acho que umas quatro vezes...
Sofia também tem uma conversa especial com o gado, que pára de comer, olhando-a com curiosidade... Talvez seja por conta dos Bar Ends, fazendo a boiada pensar que são parentes.
Sofia logo fez amizade com o pequeno bote que empurrava, e, com tanta conversa, quase tomávamos o rumo errado...
O Comandante, barbas longas como se um pirata da paz, logo arrumou a situação, e mais um pouco encostávamos na margem oposta, onde a água deixa suas marcas à medida em que vai baixando. Não seria por já estar no outro lado, muito perto de minha parada, que não deixaria de mais subir. Se você está por entre montanhas, toda boa descida encontrará um rio lá embaixo, para torná-lo a subir tudo outra vez, para fazê-lo descer tudo novamente, porque outro rio está correndo...
Passando 12 minutos depois das duas da tarde, aportamos na pousada. Morto de fome, perguntei se tinham almoço. Não tinham. Comi um sanduíche de queijo e presunto, para esperar até a janta, que sim, foi muito saborosa, afinal comi feito um cavalo, tirando todos os atrasos do dia. Não tinha sinal de nada, e o telefone deles, funcionava quando queria, mas consegui ligar a cobrar para casa, dar notícias que estava bem e alojado.
Falando honestamente, não recomendo essa pousada. Talvez a do finado Jaime, tenha melhor atendimento. Não tinham nem ventilador, e a toalha, fizeram questão de informar que a estavam emprestando. O jeito foi dormir com as janelas abertas.
Adormeci ouvindo a sinfonia, dos sapos, rãs e grilos, e dos pingos que pingaram a noite inteira.
A fofoca corria solta lá fora. Fiz sinal de silêncio para Sofia, e ficamos a perceber os sapos; o primeiro provocando:
- Foi; foi; foi; foi; foi; foi; foi; foi; foi..., e parava...
- Quem foi!?; quem foi!?; quem foi!?; quem foi!?; quem foi!?; quem foi!?; quem foi!?; quem foi!?; quem foi!?
O primeiro, em vez de responder, começava novamente a induzir tudo outra vez, e parava, para o segundo começar a perguntar de novo...
Sintonizamos os grilos, e eles não eram nada diferentes:
- Cri - cri - cri - cri - cri - cri - cri..., e paravam...
Acordei com o farfalhar de asas bem próximas do meu rosto, descobrindo ser as de um morcego, que, quase cinco da manhã, acordava-nos para a batalha; a parede próxima de mim, pontilhada de pernilongos obesos, todos eles às minhas custas...
Agora eram os galos,,,. todos eles alucinados..., um xingando a mãe do outro...
Já estava acordado, arrumei minhas coisas, tomei um bom banho no banheiro que é coletivo, e preparei-me para o café da manhã: trouxeram-me lá de dentro, 3 fatias de pão, café preto, um pote de margarina que não toquei, uma porção de doce ou geleia de goiaba. Perguntei se podiam fritar dois ovos e fui atendido. Na hora de pagar a conta, cobraram-me quase o dobro do combinado, mas já era outro dia, uma linda Usina a ser conhecida, uma bela subida a ser vencida, e dei a Cesar o que era de Cesar...
Não azedou, porque Sofia não deixou...
* * *

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