Máquina parada - Máquina enferrujada...

Não importa se você já subiu o Everest; se não continuar subindo, você enferruja...

Não importa se você guarda as botas com que andou o Caminho de Santiago de Compostela; se não as continua calçando, elas estragarão...

E como em bicicleta não podemos parar, o jeito é pedalar...

Experimentem uma pequena trilha, seja lá do tamanho que for, e nunca mais conseguirão se livrar da sujeira..., onde até o ralar da canela não dói...



Máquina parada - Máquina enferrujada...
(Paulo Boblitz - jul/2009)


Essa é uma lei bastante antiga, talvez anterior à Revolução Industrial.

Seja como for, ela nesse domingo funcionou comigo; comigo e com a minha bicicleta...

Estava há algum tempo parado, quando o amigo Omar fez o convite:

- Vai ser moleza...; bem leve...

Seis horas em ponto, estava no lugar combinado e logo o grupo inteiro foi formado.

Na noite anterior, havia feito uma pequena revisão na magrinha, como azeitar a corrente, encher os pneus com 50 libras (fica como se fosse de madeira...), instalar os acessórios, verificar freios, deixando-a pronta para a montaria e a partida.

Pegamos o caminho, plano e liso pelo asfalto, 20 a 22 quilômetros por hora, como velocidade de cruzeiro, o grupo coeso num domingo cedo e calmo.

Até ali tudo ia bem, até que o asfalto foi ficando feio, ficando feio, feio..., e mais um pouco estávamos num estradão de piçarra, mas até esse também foi piorando, até que finalmente entramos no caminho natural, como ele sempre esteve ali, trechos de areia molhada, trechos de argila molhada, um pouquinho de lama aqui, outro pouquinho acolá, e minha magricela a querer ficar grudada a cada metro percorrido...

Já naquele encontro inicial, antes de partirmos, não olhei com bons olhos de pedaleiro, quando verifiquei todos com pneus lameiros, tipo todo-terreno, e apenas eu com pneus lisos. Ali já pressenti o que me estava a aguardar...

Agora vinha a confirmação; uma desgraça..., em todos os sentidos...

Cercado pela bela Mata Atlântica, acariciado pela umidade matinal que ajudava a embaçar meus óculos, lá estava eu, escorregando, afundando, perdendo o equilíbrio, e perdendo o gás, o mais importante...

Uma turma de ciclistas, antes de tudo é solidária. Assim, fui ficando para trás, para trás, para trás..., e logo mais três se obrigaram a também ficar.

Sutilmente, depois de alguns minutos pedalados, fui informado que dividiam o grupo em três categorias: o da elite, aquele que eu já perdera de vista lá na frente, o intermediário, como o nome sugere, pelo meio, que eu também já perdera de vista, e o da carniça, que somente atrasa os outros dois primeiros...

O que já estava difícil, ficou pior ainda..., não pela minha categoria recém conquistada, mas porque comecei a rir... Não satisfeitos, começaram a contar os "causos" das várias trilhas passadas, o que só aumentou a perda de fôlego, pois sorrir sempre será um bom remédio, mas nunca no meio de um exercício...

Na primeira subida, que mentirosos juraram ser a única, bem antes do meio saltei e a subi andando - que fossem matar a outro...

Quando a coisa está ruim, nada impede que piore...; minhas marchas começaram, a troco do nada, a saltar me produzindo pedaladas vazias... Juntou-se a perda de gás, com a perda de energia...

Tem sempre um momento em que a gente dá um basta; o meu foi quando chegamos à cidade de São Cristóvão, antiga capital do Estado de Sergipe, na rodovia João Bebe Água, a combinar comigo, bebendo água como se fosse um camelo...

Comuniquei ao grupo que me esperava, elite e intermediária já postados na entrada para a outra trilha que seguiria até a BR-101, um outro tanto daquele já percorrido, que ali eu ficaria. Não sei por que, mas achei que eles sorriram...

Eu também sorriria se estivesse me livrando de um carniça...

Omar, João de Deus e Gilton, escoltaram-me até o arco da entrada da velha cidade, mas só me largaram depois que confirmei com o meu filho, o meu resgate com a nossa caminhonete. Ali fiquei e eles voltaram, para mais trilhas pelo meio do mato...

Mais um pouco, meu filho chegou e fomos até o ponto de encontro, onde tomaríamos um lauto café da manhã; metade da turma já havia chegado; a outra metade vinha pelo caminho. Comuniquei a todos que estava bem e fomos embora; cheguei em casa, tomei um bom banho e fui para a Roça.

Meu caminho é pela BR-101, e lá estavam todos eles, de volta agora num grupo bem maior, pois juntou-se a eles o grupo dos que seguiram para a Caueira, uma praia do interior.

Vistosos, suados, coloridos, bicicletas imundas, um a um fui cumprimentando com buzinadas, recebendo braços erguidos e sorrisos, uma camaradagem boa e sem igual, onde o que importa é a companhia, a solidariedade, o gastar energias e as conversas, pondo a saúde em dia, a mente sã, sobre dois pedais respirando ar puro, ao longe avistando sempre uma vista linda, ao fim, conquistando um "conseguimos", cheio de cansaço e orgulho.

Hoje mandei minha bicicleta para a revisão geral; amanhã a pego com outros pneus...

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