Comendo fibras...

Ajuda é a mulher do Juda,

já dizia um bom amigo há muito tempo...

Mas tudo não passa de invenção,

uma brincadeira com o termo.

Aviso: não sigam a receita, pois ela não existe, assim como o Raimundo Aniceto.


Comendo fibras...
(Paulo R. Boblitz - jan/2011)

Meu nome é Raimundo Aniceto, recentemente também conhecido por Marciano. Minha história não é tão longa, nem tampouco tem um final curto.

Sempre sofri de prisão de ventre, e já estava conquistando aquilo que chamamos de hemorróidas.

Pois bem, pedalando por aí, encontrei o Boblitz também pedalando, contando-lhe o meu problema. Hoje sei que foi uma infeliz iniciativa...

- Você precisa comer fibras... - ele me disse.

- Macrobiótica..? - perguntei.

- Não!!! Macrobiótica já está ultrapassado... Você tem que comer estopa...

- E onde eu encontro? - perguntei.

- Nessas casas de produtos naturais, deve vender... - ele respondeu.

- E como é que eu faço para preparar?

- Você deixa a água ferver e quando ela estiver fervendo, jogue a estopa dentro e mexa um pouco, apagando o fogo. Essa água, você aproveitará para fazer o arroz...

E continuamos a pedalar, pois estava um domingo bem bonito. Naquela noite necessitei ir ao supermercado para comprar algumas coisas e, passando por uma gôndola daquelas, vi um saco "Estopa Super". Tinha na cor amarelada e na cor branca, "fibras selecionadas", dizia esta última. Baratinho, comprei logo uns 5 pacotes da branca.

Fiz o que o Boblitz ensinou e, enquanto a água fervia, com uma tesoura fui cortando aqueles novelos em pedacinhos menores. Mas, e o tempero?

- Boblitz!, posso botar sal? Como é que eu como? - perguntei pelo telefone.

- Bote pouco sal, para não aumentar a pressão; você pode comer com azeite, se quiser... - ele respondeu.

Só de pensar nos efeitos, já estava começando a peidar, cada um pior do que o outro, afinal, acho que eu já ia pelo quarto dia...

Enquanto fazia o arroz, ia comendo aquilo, um gosto horrível, mas se o Boblitz havia ensinado, é porque me faria bem.

Para encurtar a história, quase levo porrada da esposa, pois que nem os cachorros quiseram o arroz, mesmo com carne moída. Somando tudo, já estou há pelo menos doze dias sem cagar, aspecto esverdeado, daí a razão de me chamarem de marciano.

Isso não podia ficar assim, portanto recorri à Justiça, para indenização a vários danos...

- O senhor ainda está entupido? - perguntou o Juiz com certo sorriso que não bem entendi, diante do Boblitz, o acusado, também sorridente. Todos naquela sala pareciam estar se divertindo...

- Não senhor; já consegui evacuar... - respondi meio envergonhado, diante do olhar furibundo de minha doce mulher.

- E como foi que saiu? - perguntou novamente o Juiz, desta vez nitidamente contendo o riso.

- Em bolotas, meio enroladas, cheias de nós, em pequenos novelos... - respondi quase sumindo na minha cadeira, até com cara de choro...

O Juiz então se virou para o Boblitz, e, bem sério questionou:

- Bonito, né!? Como é que o senhor faz uma coisa dessas? Não se envergonha de tentar matar o amigo?

- Não foi bem assim, meritíssimo; eu recomendei que ele comprasse estopa numa casa naturalista, e ele comprou num supermercado..!

- E qual a diferença? - o Juiz já estava interessado...

- Bem, a estopa que ele comprou, embora de origem vegetal, é utilizada para limpeza ou polimentos em superfícies lisas e brilhantes, como pintadas... A estopa que eu me referia, era ao Jequitibá, árvores muito antigas, algumas com mais de 3.000 anos, gigantescas na altura e no diâmetro, nativas do nosso querido Brasil. Como vê, eu ensinei a fazer uma coisa, e ele fez outra... - concluiu o Boblitz, levantando os ombros.

- Qual a dosagem? Como é que eu preparo? - já o Juiz entabulava outra conversa, esquecendo de mim, pois parecia sofrer também de prisão de ventre.

Assim, foi preciso, depois de levar uma joelhada da esposa por baixo da mesa, fazer "hum-hum" com a garganta, para podermos voltar ao julgamento...

- Senhores, esta Corte se pauta pela reconciliação, e isso se faz necessário agora, quando nitidamente um mal entendido ocorreu por conta do nosso vernáculo. Assim, se existe um culpado nisso tudo, ele se chama Camões... Quero crer que o senhor Marci..., quero dizer, Raimundo Aniceto, saberá entender que não houve má fé na recomendação do amigo Boblitz, embora tenha sido conduzida com menor esmero...

Fiquei olhando para o tampo daquela grande mesa lustrosa, talvez polida com uma das estopas que andei comendo, concordando que mal entendidos acontecem. Só não deu mais para ser o mesmo amigo do Boblitz, pois agora, além de ser conhecido por Marciano, a esposa também me chama de Estopa, principalmente naquelas horas em que ela dizia ter dores de cabeça...

Enquanto eu levantava da cadeira, ainda pude ouvir o Boblitz ensinando a receita ao Juiz. Como o assunto ainda me interessava, fiz de conta que me atrapalhava com alguma coisa, apenas para vê-lo interromper a explicação...

- O senhor pega a erva e... Quer saber? É melhor o senhor consultar a especialista lá na casa naturalista - concluiu o Boblitz, diante da sobrancelha arqueada do juiz, quando ele falou em erva.

Fui embora, não ganhei a causa, continuo sem saber a receita, sou Marciano e Estopa... É melhor eu comprar laxante na farmácia...

* * *

Vale a pena conhecer o Jequitibá, em tupi-guarani "Gigante da Floresta": http://pt.wikipedia.org/wiki/Jequitib%C3%A1

* * *

Nenhum comentário:

Postar um comentário